domingo, 8 de março de 2009

Cultura para as Massas ou Cultura Spagetthi?

"As pesquisas dos psicólogos e sociologos mostraram-nos as forças imensas que nós precisamos de domesticar, sob pena de assistirmos à destruição da nossa cultura; a TV pareceu-nos algo como a energia nuclear; e tal como a energia nuclear, só podem ser determinadas as suas finalidades com base em claras decisões culturais e morais. As pesquisas psicológicas indicam-nos também os caminhos para futuras investigações sobre a «linguagem» televisiva. as suas possibilidades, os seus limites, a sua área de desenvolvimento; as sociológico-políticas abriram-nos dimensões mais vastas de empenho polémico. Se as conclusões, às quais nos pareceu podermos chegar a pouco e pouco, são substancialmente optimistas, não devem porém ser interpretadas como abandonos a uma mistica do laissez faire. Mesmo quando se convenha que neste terrível e poderoso meio de massas se reúnem as várias possibilidades de difusão cultural para o futuro próximo, é preciso não esquecer a natureza emocional, intuitiva, irreflectiva de uma comunicação pela imagem.
Lembramos que uma educação através das imagens foi típica de qualquer sociedade absolutista ou paternalista; desde o antigo Egipto à Idade Média. A imagem é o resumo visual e indiscutível de uma série de conclusões a que se foi chegando através da elabpração cultural; e a elaboração cultural que se serve da palavra transmitida por escrito, é apanágio da elite dirigente, ao passo que a imagem final é construída para a massa submetida. Neste sentido têm razão os maniqueístas: existe na comunicação por imagem algo de radicalmente limitativo, de insuperavelmente reaccionário. E, todavia, não se pode recusar a riqueza de impressões e de descobertas que em toda a história da civilização os discursos por imagem deram aos homens.
Uma sábia política cultural (ou melhor, uma sábia política dos homens de cultura, todos eles de co-responsáveis pela operação TV) será a de educar, eventualmente através da TV, os cidadãos do mundo futuro a saberem temperar a recepção de imagens com uma igualmente rica recepção de informações «escritas».
A civilização da TV como complementar de uma civilização do livro. Talvez seja menos difícil do que se julga, mas não seria utópico pedir à TV uma série de programas didácticos destinados a «descondicionar» o público, a ensinar a não ver televisão mais do que o necessário, a dominar a identificação por si do momento em que a audição já não é voluntária, a atenção torna-se hipnose e a convicção assentimento emotivo."
Umberto Eco «Apocalipticos e Integrados» pags 393/395