quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Paraíso Perdido



As pedras não são apenas o esqueleto da mãe Terra, que vemos nas altaneiras montanhas recortadas contra o céu, nos calhaus polidos pelas ondas nos areais das praias, nas formas exóticas que a natureza esculpiu na paisagem com as mãos do vento e os dedos ágeis da chuva. São também o brilho raro e fascinante das jóias raras que adornam a opulência ostensiva; os diamantes que prometem o amor eterno, as esmeraldas que apagam mágoas e ressentimentos, o jaspe que promove a coragem, a pérola que traz a paz, o quartzo que renova a confiança, o rubi que confere a liderança...
O poder das pedras está ligado a algo muito consistente, durável, confiável e tangível, porque é constante e seguro, porque faz parte de uma força suprema que nos é familiar, que nos protege, que nos ameaça, que nos é, sobretudo, superior, e sobre a qual não conhecemos os desígnios mas podemos confiar na constância: a Terra.
Os nossos antepassados, quando sentiram o medo e a incerteza do mundo exterior, refugiaram-se nas suas entranhas, veneraram-na como mãe protectora, desenharam na sua pele os rituais mágicos dos seus desejos, exorcizaram os seus terrores nocturnos esculpindo sinais, tentando entender o mundo que os rodeava na segurança do seu ventre. E as pedras tornaram-se desde então para o homem um símbolo e, como todos os símbolos: um Poder.
O poder da pedra: uma inteligência fria, constante, preseverante, que a tudo assistiu indiferente, desde o nascer da Luz ao crepúsculo de inúmeros deuses, na sua lentíssima mas segura evolução desde os recônditos da existência, na sua jornada eterna e complexa, a queda do sublime à suprema densidade e de novo a ascenção da sua essência densa e petrificada à ligeireza fugaz do espirito sem barreiras.
O homem-instintivo, perto demais ainda da essência da matéria que o criou, compreende-a e teme-a; conhece pelos sentidos da sobrevivência as suas mudanças subtilíssimas, como cheira no vento as tempestades. Para o homem instintivo tudo são sinais que mais tarde transformará em símbolos, a que dará som, a que designará para conter, a que dará um nome para dominar.
É dessa intimidade que nasce a Magia. O símbolo de um poder que se pode designar, portanto conhecer, logo possuir.
E as pedras foram e são o mais poderoso objecto de magia porque estão ligadas ao Conhecimento íntimo da Terra, ao seu plano primordial, silencioso e implacável, de decantar o espirito através das maiores densidades, através de todas as transformações do fogo, da água e do ar.
E este homem instintivo, agora mágico, que podia comparar transmutações com a sua nova ferramenta: o espirito individual, podia também aperceber-se dos espiritos colectivos que o rodeavam e, sendo ele também colectivo, dominar as leis gerais, sem vontade própria, de que a Natureza era composta. Mas, para isso, era necessária a cumplicidade da Terra. Denominada, mas não dominada, a Terra acedeu, certa porém no seu lentíssimo pensar que o homem cometia um erro: o de exilar-se da Natureza como um elemento de caos do seu destino em comum. Porque esse exílio, essa não comunhão, só poderia criar um novo paradigma: o Ter.